A classificação é uma função importante para a transparência e o compartilhamento de informações, que são caminhos seguros para a tomada de decisão, para a preservação da memória técnica e administrativa das organizações contemporâneas e para o pleno exercício da cidadania. Ela é uma atividade reconhecida, pela maior parte dos autores que tratam da questão, como matricial. Ela precede todas as outras atividades. Entretanto, há um espaço muito grande entre o reconhecimento de sua importância e o aprofundamento teórico sobre o tema. Esse distanciamento somente poderá ser encurtado com o desenvolvimento de pesquisas. E nesse ponto, parte-se do pressuposto formulado pelo arquivista canadense Jean-Pierre Wallot, ex-presidente do Conselho Internacional de Arquivos, que sem a pesquisa, a Arquivística está condenada a permanecer como um corpo de práticas e de receitas sem racionalidade científica. O fato de ser uma disciplina com finalidades pragmáticas a coloca em uma fronteira perigosa com o empirismo. É necessário, portanto, buscar uma fundamentação teórica para o tratamento da questão da classificação na Arquivística.

No Canadá, embora inicialmente os conceitos de fundo, respeito aos fundos e proveniência tenham sido úteis para harmonizar ad hoc as técnicas de arranjo e descrição, com o passar do tempo a realidade intelectual da proveniência e a realidade física dos documentos tornaram-se tão entrelaçadas que se perdeu a distinção entre o criador e a criatura. As Normas de Descrição Arquivística (Rules for Archival Description – RAD), por exemplo, estabelecem uma abordagem para os fundos que não permite a descrição de documentos virtuais acumulados ao longo do tempo e dispersos no espaço. Para reavaliar o conceito de proveniência, a autora examina o uso desse termo na Arqueologia e na Museologia. Adaptando as definições dessas áreas de conhecimento para o contexto arquivístico, a autora argumenta que os arquivistas devem descrever os documentos remanescentes, explicar a história do criador, seus documentos e como foram parar naquela instituição. Os arquivistas devem ampliar os elementos das RAD, intitulados “procedência” e “história arquivística”, e centrar-se em nova perspectiva, não de respeito aos fundos, e sim de respeito à proveniência, a qual englobará a história do criador, a história dos documentos e a história arquivística. A descrição arquivística deve abranger todos esses elementos, permitindo que os arquivistas forneçam, da forma mais ampla possível, a contextualização dos documentos, tornando-os mais responsáveis por suas próprias ações e, ao mesmo tempo, mais transparentes quanto à gestão dos documentos sob seus cuidados. Os arquivistas devem abandonar o conceito de fundo, tendo em vista que essa ideia rotula o documento como algo utópico, ignorando a realidade de sua existência ao longo do tempo e espaço.

Estudo sobre a trajetória do conceito de classificação de documentos arquivísticos. Buscou-se a compreensão do seu desenvolvimento na literatura e no pensamento arquivístico. Trabalhou-se com a ideia de que a classificação em Arquivística é caracterizada, por um lado, pela quantidade cada vez maior de documentos acumulados pelas instituições e, por outro, pela necessidade de fundamentar as soluções de organização e recuperação dos registros documentais nos princípios consagrados internacionalmente. Os vários momentos da classificação de documentos arquivísticos refletem, muitas vezes, o clima epistemológico da época em que foram criados e aplicados.

O presente artigo analisa o contexto, o conteúdo e as principais repercussões provocadas pela Instrução n.14, emitida pelo então ministro do Interior francês, Conde de Duchâtel, em 1841. O texto, considerado basilar para o desenvolvimento da arquivística, fundamenta o princípio de respeito aos fundos, ainda hoje o mais importante preceito para a organização e classificação de arquivos. Para além da análise de conteúdo da instrução, este artigo visa realizar uma espécie de “arqueologia” do princípio referido, contribuindo assim para o debate e a consolidação do pensamento arquivístico.

Os brasileiros que frequentaram cursos nos Estados Unidos e estagiaram nos Arquivos Nacionais de Washington conheceram o prof. Ernst Posner, antigo membro dos Arquivos da Prússia e, desde 1939, professor da American University, de Washington, na qual se oferecem cursos para arquivistas. Todos dele se recordam com a melhor impressão e não esquecem suas lições e sua figura, misto de erudito germânico, de humanista europeu e de arquivista profissional. Creio que poucos ensaios especializados terão tanta força de generalização, tanto espírito de crítica e concentração, como este trabalho, que oferece uma valiosa síntese da evolução e dos problemas dos arquivos desde a Revolução Francesa até 1940.